Por.: Mayara Melo
Passou a língua na borda do envelope e fechou a carta como
quem sabe que seus mais ocultos segredos não estavam nem estariam seguros
quando se tratasse dele. Sempre que ele
a lesse – quer fosse uma metonímia, como aquelas de trocar o autor pela
obra, ou só de olhar pros seus trejeitos – saberia o que ela estaria pensando.
Difícil mesmo era saber se ser tão transparente era bom ou ruim...
De vez em quando o mundo confundia sua verdade com fraqueza.
Estar exposta assim poderia torná-la vulnerável.
De vez em quando, não sabia o que dizer, mas só de olhar as
pessoas já entendiam o que ela trazia bem lá no fundo.
Bem que ser assim lhe servia quando estava chovendo na vida
de alguém, nunca fora mesmo tão boa assim com as palavras, mas tendo essa
virtude (virtude?) sim, poderia fazer com que lhe achassem boa só com um
abraço. Sorriso, olhar de atenção.
Pelo menos chovia, e as vírgulas formadas pelas gotas na
janela faziam um barulho que, se ela precisasse, encobriria seus choros. Foi só
notar isso que se sentiu à vontade pra postar o envelope na carta do correio.
Era um poema de amor.
Um indício que estava ficando dormente, um passo para o salto do precipício... Não importava. O som da chuva no vidro da janela
garantiria que, se viesse a chorar, sempre existirão águas maiores pra nos ensinar que a vida é
muito mais que o amor.